Eu trabalhava na agência de publicidade W/Brasil e não me lembro ao certo o motivo, mas a questão é que havíamos perdido o prazo da Rede Globo para entregar as peças publicitárias e o espaço já havia sido comprado.
Todas as peças de veiculação nacional tinham que ser enviadas e entregues em mãos a cada filial da emissora por todo o país e por isso havia este prazo.
Bem, talvez se fosse hoje, o caos estaria instalado. Talvez a reação de um profissional sem internet, sem sedex e com prazo estourado fosse similar a uma ameaça de guerra ou Tsunami. Eu seria uma destas que entraria em pânico.
Mas naquela época, o que houve em um final da tarde, geralmente regado a picolé de uva, foi um bafafá (termo usado naqueles tempos, indicando um murmurinho).
E se a solução dos problemas hoje, são mais eficazes, eficientes e num piscar de olhos, naquela época, no entanto, era, muitas vezes, poético.
A saída para a crise, foi a de enviar fiéis mensageiros como pombos correios humanos em asas metálicas a cada capital para entregar, o que na época, era uma espécie de tijolo, o filme publicitário.
Fui sorteada para entregar a peça em Recife. E lá me fui. A missão era a de entregar o filme nas mãos de um responsável da emissora, que estaria esperando no aeroporto. Sempre prevenida, fui com um biquíni básico por baixo da roupa. Nunca se sabe.
Ao chegar, o responsável me ofereceu uma carona com o motorista para onde eu quisesse ir...Claro, parei em Boa Viagem e fui dar um mergulho e almoçar. Naquela época, os tubarões daquela praia não mordiam ninguém.
Então, peguei um táxi a fim de voltar ao aeroporto. Conversando com o motorista, contei do motivo de estar ali. Ele perguntou se eu já tinha ido a Olinda. Eu disse que não. Assim, o sujeito deu meia volta, fez o caminho contrário ao aeroporto em direção à cidade de Olinda.
Um verdadeiro guia, me contou um pouco de tudo. Batia uma brisa agradável e pude caminhar no novo destino, totalmente improvisado. Anos depois, voltei a Olinda e fiquei hospedada por lá, com reservas, motorista, hora marcada. Não foi nem de perto, tão emocionante quanto ao dia do improviso.
Olinda foi a primeira cidade brasileira a ser declarada patrimônio cultural pela UNESCO.
Na volta do passeio, em excelente companhia do guia/taxista, ele parou no mercado - que ainda não tinha pegado fogo - e me trouxe um acarajé gigante e água de coco, para que meu trajeto até o aeroporto fosse regado com as melhores sensações! Não cobrou nada além do trajeto até o aeroporto, Com prazer dei uma bela gorjeta. Isto sim é um profissional de marketing dos bons!!
Não me lembro bem porque, mas o voo fez uma escala em Brasília. No embalo do improviso, enquanto um povo descia e o outro subia, ousei bater na cabine do piloto. Perguntei se eu poderia ver de frente um avião decolar. Super simpático ele autorizou de imediato. Hoje, acredito, não é mais permitido, mesmo porque ninguém ia querer, já que é possível ligar o celular e enviar e-mails, checar o Instagram, Facebook, Twitter e Linkedin durante o voo....
Assim, apertei meu cinto em uma banquetinha bem atrás do piloto e fiquei bestificada com o número de botões que ele tem que checar com o copiloto antes de partir. Foi lindo!! Claro!
Ele pediu então que eu retornasse ao meu assento e que eu poderia voltar, mais tarde, para assistir o pouso.
Já praticamente da família, me sentindo como parte integrante da tripulação, voltei. Acho que cedo demais, porque a cena que vi nunca mais saiu da minha memória. O piloto estava comendo uma fatia de melancia com as duas mãos! Ninguém segurava o manche!!!! Ao ver os meus olhos de terror, me tranquilizou contando das modernidades de um piloto automático.
Enfim, já havia escurecido e pude assistir São Paulo (uma verdadeira caixinha de joias), com as luzes brilhando. Pousei em Congonhas, olhando de frente!
Ainda bem que não havia Internet nem Sedex naquela época! E ainda bem que hoje tem, assim posso contar esta história para você! Coisas da vida!