Eu tenho um amigo que diz que, em outra vida, ele deve ter
nascido e vivido em Paris, já que se sente em casa a cada vez que chega à
cidade. Tenho outros amigos que se entregaram a esta sensação e ficaram de vez.
Já fui um deles.
No livro “The Secret
History of Paris”, Andrew Hussey, editora Amarilys, 2006, o autor cita algo
que talvez possa traduzir um pouco esta minha busca eterna:
“O
explorador busca intoxicação, desorienta-se deliberadamente e prepara-se para
se perder na cidade a fim de achar sua própria saída. Enquanto o familiar se
torna desconhecido, o novo e o velho dos prédios, ruas, sinais de trânsito,
quadras e espaços abertos são revelados.”
Há algo em Paris. Talvez na forma dos candelabros que sombreiam
e iluminam pisos em mosaico às entradas dos edifícios seculares, de gradis
rendados e carregados de memória; talvez na simetria em tudo, na cor do
calcário e no formato das chaminés. Esta composição penetra pelos poros quando
a brisa que vem do Sena, carregada de história e espírito, sopra a vida no
rosto.
Paris me dá a sensação de
“pertencimento”. Sinto-me inserida em um contexto e me encanto com o que sinto.
O idioma é música para os meus ouvidos e a música que vem do
acordeon me provoca frio na barriga; Os aromas da culinária das esquinas abrem um
apetite que não sente culpa, nem conta calorias. Celebrar a vida com champagne passa a ser diário e
necessário.
Paris tem este não sei quê, como se fosse um espírito que invade
o corpo e eleva a alma ao estado de graça.
A boa e a má notícia é
que esta sensação é viciante. Preciso de uma dose todos os anos.
Quem compartilha deste sentimento está sempre buscando as
melhores palavras e expressões, além dos motivos racionais e emocionais para tal
vicio! Danuza Leão observa em seu livro “Fazendo as Malas”, Companhia das
Letras, que há uma sensação leve e gostosa de que em Paris as coisas continuam
sempre no mesmo lugar, como a Brasserie Lipp, por exemplo.
Por outro lado, se existe esta sensação do conhecido e
permanente, parece que Paris entrega seus segredos de forma inesgotável, ou
seja, sempre há algo novo a encontrar. Balzac dizia que Paris era como um
Oceano, você pode atirar a linha de medição, mas nunca vai penetrar em suas
profundezas. Baudelaire compartilhava desta ideia. A exploração e descobertas
não acabam nunca.
Um dos primeiros autores de guias, Piganiol de La Force já
dizia, em 1795: “Estaria muito enganado
quem visse o vasto numero de livros dedicados à história de Paris (...) e
imaginasse que nada mais havia a ser dito”.
Mas por que falar destes lugares, especificamente? No livro “Paris,
Biografia de uma Cidade” de Colin Jones, li que o historiador Pierre Nora
classifica estes lugares como “lieu de mémoire” (local de memória), ou seja,
local onde se focou a consciência histórica e que ainda recebeu contínuas
incrustações da memória coletiva. Tanto
a consciência de quem protagonizou ou testemunhou aquele momento histórico
quanto à consciência de quem visita, todos os dias, estes locais e que deixaram
armazenados ali pensamentos, sentimentos, impressões e expressões.
Se me permite um conselho é que nem ignore demais as informações
sobre cada visita e, ao mesmo tempo, não exagere querendo saber o que significa
cada construção de cada esquina... Não dá! O bom senso sempre pede o
equilíbrio!
Proponho que experimente tornar-se um “flâneur” à La Baudalaire,
ou seja, aquele que caminha observando e assimilando, analisando e sintetizando,
contemplando e deslumbrando, compondo e desfrutando da experiência a altura e
respeito ao que a cidade oferece, de forma quase “preguiçosa”.
Já que o cérebro não consegue armazenar tanta informação como
você quer e nem o seu físico aguenta tudo o que você imagina que possa fazer,
em curto espaço de tempo, se insistir em cumprir os 12 trabalhos de Hércules,
terá visto, mas não vivido. É diferente!